Os Wari' comiam não só os inimigos que matavam, mas também
os mortos do grupo. O rito tinha início já na doença grave, quando o moribundo
era chorado por parentes consangüíneos e afins. Desde aí, iniciava-se um canto
fúnebre, em que todos se referiam ao doente/morto por termos de consangüinidade,
e relembravam fatos vividos com ele. Diante da morte, o choro se intensificava.
Os parentes próximos, chamados de "parentes verdadeiros" passavam
então a diferenciar-se dos "parentes distantes", categoria que aí inclui
especialmente aqueles efetivamente relacionados pelo casamento. Os primeiros
organizavam o funeral, e os últimos o executavam.
Antes que o cadáver pudesse ser preparado, devia-se aguardar
a chegada dos parentes próximos que viviam em outras aldeias, e que recebiam o
aviso da morte por meio desses mesmos afins. Nesse período, de cerca de dois a
três dias, o cadáver apodrecia, e é nesse estado que era cortado e moqueado
pelos afins. Pronta a carne, os parentes próximos a desfiavam e depositavam-na
sobre uma esteira, ao lado de pequenos pedaços de pamonha de milho assada.
Solicitavam então aos parentes distantes que a comessem. Não se devia pegar a
carne com as mãos, mas espetá-la em pauzinhos, levando-a delicadamente à boca.
Os Wari' não gostavam que se comesse do morto com avidez, como se fosse carne
de caça, e o apodrecimento, que aparentemente era conseqüência de um
prolongamento inevitável do velório, já que os parentes que moravam longe
faziam questão de ver o cadáver íntegro, era também um modo de tornar a
ingestão da carne desagradável, às vezes quase impossível. Nesses casos,
comia-se só um pouco, e o resto era queimado, juntamente com os cabelos, órgãos
internos (com exceção do fígado e do coração, que eram comidos), e genitália.
Finda a carne, os parentes próximos decidiam se os ossos
seriam queimados e enterrados com o moquém, ou se seriam macerados e ingeridos
com mel. De um modo geral são os parentes distantes que ingerem os ossos, mas
algumas pessoas afirmam que essa parte do repasto cabia aos netos, que também
eram os comedores preferenciais dos miolos assados do morto.
Após o funeral, iniciava-se o período do "varrer",
quando eram queimados todos os pertences do morto, desde a casa que construíra,
o local onde havia sido assado, até sua roça de milho e os lugares na floresta
onde costumava andar e se sentar. Um luto prolongado, de vários meses ou mesmo
anos, terminava diferencialmente para os diversos parentes, que decidiam quando
deveriam voltar a falar normalmente e a participar de festas. Realizavam então
o rito de final de luto, quando uma grande quantidade de presas previamente
moqueadas, resultantes de uma caçada coletiva, eram choradas como se fossem o
morto. Essas presas eram depois comidas não só por não-parentes, mas também
pelos consangüíneos próximos. Depois disso cantava-se e dançava-se e a vida
voltava ao normal. O espírito do morto passava a viver plenamente no mundo
subaquático dos mortos, como acontece ainda hoje. Quando quer vir à terra ver
os seus, ou passear, torna-se queixada, sendo caçado e comido pelos Wari', e
retornando ao mundo dos mortos.
Atualmente, os mortos não são mais comidos, mas enterrados,
depois de chorados por dois ou três dias. O abandono do canibalismo ocorreu
pouco tempo depois da "pacificação".
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